O extermínio de inocentes no Antigo Testamento
A violência que aparece no AT está de
acordo com o sentimento e a moral da época. Deus age conforme o nível e o
entendimento do homem. Também não podemos tomar todos os relatos de
violência ao pé da letra, algumas vezes é apenas figura de linguagem e
não realidade. É ainda D. Estevão Bettencourt , no seu livro “Para
entender o Antigo Testamento”, quem nos ajuda a entender essas cenas de
violência que nos assustam.
Para
os hebreus o extermínio dos inimigos se tornava religiosamente
necessário e imperioso: este povo e ele só, possuía a verdade da fé,
para um dia transmiti-la ao mundo; portanto, era de sumo interesse na
história sagrada que Israel não deixasse corromper a sua religião.
Então, não havia outro jeito a não ser separar Israel do convívio dos
outros povos pagãos, por causa da influência e prejuízo que isto
causaria a fé de Israel.
O extermínio dos inimigos (hérem,
anátema) se baseava num grau de cultura pouco evoluída e também numa
concepção religiosa estranha para nós hoje. Não se esqueça que Abraão
foi tirado da Mesopotâmia pagã que acreditava que os astros eram deuses.
Neste contexto, cada povo julgava que, na guerra a honra dos seus
deuses estava em jogo; uma derrota militar representava vergonha e
escárnio para os deuses da nação vencida, assim como a vitória
significava triunfo da divindade.
Assim, os deuses dos povos vencedores julgavam que deviam ser religiosamente sacrificados e imolados, por um ato de extermínio total, os homens, as famílias, as cidades, os haveres, do povo vencido. O uso era tão comum que não somente os semitas, mas também os germanos e astecas da América o praticavam no México, já no nosso século XVI. O escritor Tácito dizia que “Os vencedores devotaram a Marte e Mercúrio o acampamento inimigo, voto este, em virtude do qual são entregues ao extermínio cavalos, homens e tudo que pertence aos vencidos.” (Annales, 13,57)
Assim, os deuses dos povos vencedores julgavam que deviam ser religiosamente sacrificados e imolados, por um ato de extermínio total, os homens, as famílias, as cidades, os haveres, do povo vencido. O uso era tão comum que não somente os semitas, mas também os germanos e astecas da América o praticavam no México, já no nosso século XVI. O escritor Tácito dizia que “Os vencedores devotaram a Marte e Mercúrio o acampamento inimigo, voto este, em virtude do qual são entregues ao extermínio cavalos, homens e tudo que pertence aos vencidos.” (Annales, 13,57)
Portanto, esta prática era muito comum na
Antiguidade antes de Cristo; era o rosto mais duro do paganismo. Os
gauleses, por exemplo, queimavam as presas ou as atiravam aos lagos. A
Bíblia mostra outros exemplos disto (2Cr 32,14; Is 37,11; 2Rs 14,11).
Esta praxe era familiar aos antigos,
normal para eles, e Deus respeitou isto nas suas relações com Israel,
até poder mudar este costume devagar, de forma que o povo pudesse
entender; foi mudando esta realidade, até que Jesus a modificou
completamente no Sermão da Montanha. Mas foi necessário um processo; de
outra forma o povo não entenderia a Revelação de Deus, e talvez o
rejeitasse por completo.
Dentro da mentalidade do Antigo
Testamento pode-se dizer que o reino das trevas (Satanás) triunfava
sobre o reino da luz toda vez que o povo judeu era vencido por seus
inimigos. Os inimigos de Israel eram tidos como inimigos de Javé (Num
10,35; Ex 17,16). O povo judeu achava que o próprio Deus exigia o hérem
(Js 10,40). Mas é bom notar que mesmo praticando o extermínio dos
inimigos, Israel o fazia de maneira muito menos cruel do que os outros
povos, como os assírios, moabitas, etc. Essas passagens mostram a
maneira cruel dos pagãos tratar os vencidos (cf. Am 1,3; 2,3; 1,13; Os
14, 1; 2Rs 8,12; 2Rs 25,7; Na 3,10 ). Portanto, o hérem praticado por
Israel era atenuado; e assim, Deus já dava a entender ao povo que era
imperfeito (cf. Dt 20,10-18; Dt 21, 10-14; Jz 212,13; 2Sm 20,14-22; 2Sm
8,2; 1Rs 20,31).
É claro que houve excessos de crueldade
por parte de alguns chefes judeus; e isto não estava de acordo com a
vontade de Deus (1Sm 27,8-11; 1Cr 22, 8-10; 28,3). E Deus repreendeu o
povo algumas vezes pela crueldade de alguns chefes israelitas e os punia
(cf. Os 1, 4ss; 1Rs 9,2-10; 2Rs 10,1-17 ).
Um outro fator a explicar a violência da
Bíblia é o fato de que os povos antigos por serem nômades, pastores,
eram coletivistas e, não como hoje, individualistas. Não havia o “cada
um para si” de hoje. Então, uma pessoa da comunidade que era ferida,
atiçava a ira de toda a tribo, que reagia com violência, não apenas
contra o agressor, mas contra a sua nação ou tribo.
Em tudo isto vemos a paciência de Deus na
sua tarefa de educar o povo. Às vezes encontramos no Antigo Testamento,
especialmente nos Salmos, palavras onde o autor sagrado deseja o mal e
até a morte aos inimigos. São frases que, a principio nos assustam,
ofendem a consciência do cristão. Algumas delas são paixão desregrada, e
não são propostas pelo Espírito Santo. Muitas, porém, não são
condenáveis; têm significado bom, até hoje válido. Para entendê-las, e
preciso entender que os autores sagrados, ao colocar uma causa perante o
Senhor, não o faziam a título pessoal, reivindicando direitos
particulares, próprios, mas advogavam os interesses do bem, da justiça
ou da verdadeira religião; sua causa se identificava com a de Deus, e os
seus inimigos vinham a ser também os inimigos de Deus. Com esta
mentalidade, e na defesa de Deus, costumavam pedir com rigor o castigo
dos adversários. Não podia haver compatibilidade entre o bem e o mal,
entre o reino de Deus e o do pecado; e o homem justo devia desejar
completa ruína a toda instituição que se opunha a Deus.
Quanto aos termos com que as imprecações
são formuladas, elas pertencem ao vocabulário oriental, dado às
hipérboles e ênfase. São muitas vezes tiradas diretamente da linguagem
militar ou do direito de guerra de outrora.
É o que dá tanta crueldade às frases
imprecatórias. Para entender a verdadeira intenção do autor sagrado, é
preciso descontar o que essas fórmulas tem de hiperbólico e
convencional. Ao ler a Bíblia devemos ver nas imprecações a expressão do
desejo de que a justiça seja feita, os abusos coibidos; entendendo-as
como dirigidas contra os males e o Mal, não contra os maus; mas contra o
pecado e contra o reino das trevas. O cristão tem por lei “amar os
inimigos, orar pelos que o perseguem” (Mt 5, 39,44).
No entanto, sem desprezar o amor aos
homens, ele deve, como Jesus, odiar ao pecado e o reino de Satanás; deve
desejar sua extirpação completa. É isto mesmo que deseja o salmista;
então, ao rezar os Salmos imprecatórios, tenha em vista os vícios e as
instituições inimigas do reino de Cristo, todas as instituições e seitas
que se esforçam por disseminar o erro e o pecado no mundo. É contra
isto que devemos proferir os Salmos imprecatórios.
Prof. Felipe Aquino
Prof. Felipe Aquino
Comentários
Postar um comentário